quinta-feira, 28 de maio de 2009

Sou negro

Ninguém é branco.
Ninguém é negro.
A cor da pele é apenas um variação de tom.
Mas se alguns dizem ser branco sem problemas,
Eu sou negro.
Não quero qualquer outro nome.
Não aceito a vergonha que me colocam
Pela magnitude do meu pigmento.

Por ser negro excluem que possa ser alemão, chinês ou francês?
Não posso ser?
Mas se nasci em Londres, sou inglês.

Fui colocado em oposição ao branco.
O branco puro e casto
O negro lúgubre e mofino
O meu corpo é negro.

Posso escrever o que vai por dentro
Para ser esquecido em qualquer sítio e sobretudo.
Que me importaria isso?
Pelo contrário.
Não sei para que escrevo nem para quem.
Não estou para ser visto, medido e avaliado.
Quero lá saber de tudo isso.

Não és poesia.
Não és amor.
Não és paixão.
Não és humano.
Não podes ser.
Não vais conseguir nada.
És culpado.

Não és nada.
Não fizeste nada.
Não construíste nada.
Não inventaste nada.

E a minha cultura que foi destruída?
Fui esquecido, fui dominado
E a minha voz que foi silenciada?
Ainda não a consegui encontrar de novo.
E a minha arte que foi roubada?
Já não volta a ser minha.
E as minhas raízes que foram usurpadas?
Não sei quem sou.
Talvez venha dali.Talvez.

O branco inventou a palavra negro, a palavra escravo
No nosso coração gerou ódio, gerou cobiça, gerou inveja
Estragou o nosso paraíso por o querer comprar
E os miúdos pedem nas ruas dinheiro para uma coca-cola
E as cidades são dormitórios ao alto sem água nem luz
A nossa escola não tem porta, nem cadeiras, nem giz
Mas o branco quer vender canetas marcadoras
Em cada poste dependurou-se um homem branco e negro
Abriram-se crianças negras e brancas em espetos de pau
Alvejaram-se brancos e negros que procuravam fugir
Lado a lado como irmãos.

Já não se pode falar de racismo.
Isso não existe.
Ninguém é racista.
Ninguém.
Mas eu sou negro.
O meu corpo é negro.
Sou sim.
Porque branco não posso ser.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Incelença pro amor retirante
(Elomar)

Vem amiga visitar
A terra, o lugar
Que você abandonou
Inda ouço murmurar
Nunca vou te deixar
Por Deus nosso Senhor
Pena cumpanheira agora
Que você foi embora
A vida fulorô
Ouço em toda noite escura
Como eu a sua procura
Um grilo a cantar
Lá no fundo do terreiro
Um grilo violeiro
Inhambado a procurar
Mas já pela madrugada
Ouço o canto da amada
Do grilo cantador
Geme os rebanhos na aurora
Mugindo cadê a senhora
Que nunca mais voltou
Ao senhô peço clemência
Num canto de incelença
Pro amor que retirou.
Faz um ano in janeiro
Que aqui pousou um tropeiro
O cujo prometeu
De na derradeira lua
Trazer notícia sua
Se vive ou se morreu
Derna aquela madrugada
Tenho os olhos na istrada
E a tropa não voltou

Análise:

No texto o eu lírico expõe o sofrimento que a ausência da amiga lhe causa. É possível identificar que se trata de um ambiente rural no trecho em que diz “Geme os rebanhos na aurora” se contrastando com o ambiente cortesão das cantigas de amor. Nesse sentido, o texto apresenta características das cantigas de amigo do período literário trovadorismo.
Sozinho
Caetano Veloso
Composição: Peninha

Às vezes, no silêncio da noite
Eu fico imaginando nós dois
Eu fico ali sonhando acordado, juntando
O antes, o agora e o depois
Por que você me deixa tão solto?
Por que você não cola em mim?
Tô me sentindo muito sozinho!

Não sou nem quero ser o seu dono
É que um carinho às vezes cai bem
Eu tenho meus desejos e planos secretos
Só abro pra você mais ninguém
Por que você me esquece e some?
E se eu me interessar por alguém?
E se ela, de repente, me ganha?

Quando a gente gosta
É claro que a gente cuida
Fala que me ama
Só que é da boca pra fora
Ou você me engana
Ou não está madura
Onde está você agora?

Quando a gente gosta
É claro que a gente cuida
Fala que me ama
Só que é da boca pra fora
Ou você me engana
Ou não está madura
Onde está você agora?

Análise:

O eu lírico também esta na voz de um homem e se queixa da indiferença da amada. Características das cantigas de amor do período literário trovadorismo
Queixa
Caetano Veloso
Composição: N.Siqueira / E. Neves

Um amor assim delicado
Você pega e despreza
Não devia ter despertado
Ajoelha e não reza

Dessa coisa que mete medo
Pela sua grandeza
Não sou o único culpado
Disso eu tenho a certeza

Princesa, surpresa, você me arrasou
Serpente, nem sente que me envenenou
Senhora, e agora, me diga onde eu vou
Senhora, serpente, princesa

Um amor assim violento
Quando torna-se mágoa
É o avesso de um sentimento
Oceano sem água

Ondas, desejos de vingança
Nessa desnatureza
Batem forte sem esperança
Contra a tua dureza

Princesa, surpresa, você me arrasou
Serpente, nem sente que me envenenou
Senhora, e agora, me diga onde eu vou
Senhora, serpente, princesa

Um amor assim delicado
Nenhum homem daria
Talvez tenha sido pecado
Apostar na alegria

Você pensa que eu tenho tudo
E vazio me deixa
Mas Deus não quer que eu fique mudo
E eu te grito esta queixa

Princesa, surpresa, você me arrasou
Serpente, nem sente que me envenenou
Senhora, e agora, me diga onde eu vou
Amiga, me diga...

Análise:

Neste texto é possível identificar algumas características que estão relacionadas com as cantigas de amor do período literário trovadorismo, o eu lírico esta na voz de um homem que se queixa da indiferença da amada.
O Trovador
Altemar Dutra
Composição: (Jair Amorin / Evaldo Gouveia)

Sonhei que eu era um dia um trovador
Dos velhos tempos que não voltam mais
Cantava assim a toda hora
As mais lindas modinhas

De meu rio de outrora
Sinhá mocinha de olhar fugaz
Se encantava com meus versos de rapaz

Qual seresteiro ou menestrel do amor
A suspirar sob os balcões em flor
Na noite antiga do meu Rio
Pelas ruas do Rio
Eu passava a cantar novas trovas

Em provas de amor ao luar
E via então de um lampião de gás
Na janela a flor mais bela em tristes ais